segunda-feira, 30 de dezembro de 2019

Poder e Tempo do Fim: notas em torno de Mad Max - Fury Road


 (Nota: texto inicialmente publicado em stasis https://www.facebook.com/stasisclub/)

Tendo como ponto de partida o filme Mad Max – Fury Road, o objetivo deste texto passa por explorar alguns temas que nele se encontram, ou a partir deste possam ser invocados. Correndo o risco de realizar uma “sobre-interpretação”, ou de projectar no filme o que nele não existe, pretende-se discutir algumas dinâmicas e lógicas do poder contemporâneo, bem como algumas possíveis formas de resistência e linhas de fuga ao mesmo – da soberania e da logística, passando pela relação entre corpo e valor, papéis de género e masculinidades, até terminar com uma reflexão mais longa sobre possíveis leituras messiânicas presentes no filme, em ligação com os temas da catástrofe e do apocalipse.

A) Soberania e teologia
Um dos principais temas do filme passa pela Soberania, em particular na sua articulação com dimensões teológicas. Desde logo, a personagem de Immortan Joe (o soberano) articula, em si, o poder divino e o poder profano devido a uma posição que remete não só para um centro de decisão e governo, mas que invoca um conjunto de práticas e significados de ordem teológica. Trata-se de uma questão observável no filme através de várias exemplos, como sejam a figura do Uno, que concentra em si o poder e a possibilidade de redenção, ou a diversidade de práticas e rituais que contribuem para uma legitimação e reprodução desse mesmo poder.
Numa das cenas iniciais do filme, na qual surge Immortan Joe, esta articulação é particularmente visível (ainda que a mesma também permita sinalizar a fragilidade e “orquestração” em que se fundamenta o seu poder, sustentado num conjunto de rituais que contribuem para que este exerça a sua “função de comando” apesar do seu “vazio”). Na cena em causa, encontra-se um Immortan Joe fisicamente debilitado, provavelmente doente e com pouco tempo de vida, dependente de várias pessoas para tomar conta de si e para o ajudarem a cumprir este ritual de demonstração do poder. Este surge no alto de uma montanha, com um conjunto de adereços simbólicos que procuram “demonstram a sua força” e singularidade (em particular, enquanto auto-proclamado “redentor”, algo que é anunciado por si aos seus “súbditos”).
Esta dimensão redentora de Immortan Joe é retomada e explorada posteriormente através da referência aos WarBoys, os quais acreditam que ele seria capaz de os guiar e levar da situação pós-apocalíptica em que se encontram para um lugar celeste que povoa o seu imaginário, Valhalla - sendo que, através de tal promessa, o Soberano consegue não só manter uma distinção que funda e legitima a sua posição, como também lhe permite incentivar a acção dos WarBoys, os quais lutam por ele na esperança de atingir a sua preferência e atingir a redenção.
De forma mais “material”, este poder também se funda no controlo que Immortan Joe detém sobre a água, aproveitando o momento em que se “mostra” à população da cidade para, de forma breve e discricionária, abrir as comportas e dar um pouco de água à população que é mantida à sede e numa situação de escassez quando existem recursos e meios suficientes para fazer face a tal cenário – no momento em que ele fecha as comportas, chega mesmo a avisar o seu “povo” para que não se deixe “viciar” em água, pois esta iria “controlá-los”. Neste sentido, existe uma ligação entre uma dimensão teológica e uma material que se manifesta pelo controlo da água e do que esta lhe possibilita, bem como pelo controlo de outros recursos e infraestruturas de que dispõe (algo a ser explorado à frente).
A relação entre soberania e “vida nua” também se encontra presente no filme. Esta é representada de várias formas, sejo num sentido mais restritamente biológico (enquanto zoe) como sucede através da situação dos WarBoys (também designados de “meia vida”, numa estado entre a vida e a morte apesar de constituir grande parte do exército do Soberano), das “5 esposas” e das “mães de leite” (cuja existência é reduzida a uma dimensão biológica, determinadora da sua “função” e papel na sociedade em questão), da figura de Max (tanto enquanto alguém exterior exterior do sistema político em causa, como enquanto mera redução a “bolsa de sangue”, desta forma usado para garantir a existência dos WarBoys), seja da própria população (afastada da política e alvo do Soberano). Para Agamben, a vida nua constitui o “primeiro referente e fundação da política” que marca a história da política ocidental, naquilo que é um processo de “inclusão por exclusão” em que a vida (a qual não é em si mesma política,pelo menos na sua dimensão biológica, enquanto zoe), se vê, ao mesmo tempo, excluída da vida política e incluída e capturada pelos dispositivos de poder através deste processo – sendo esta razão que faz com que, para Agamben, a política ocidental adquira uma forma biopolítica. Neste sentido, e como fundação e garantia de reprodução do poder soberano, tal forma de poder deva ter como principal função a produção de vida nua - não sendo possível pensar outra dimensão da vida, de uma vida ética e política, enquanto não se desativar o dispositivo que produz e captura a vida nua.
Contudo, e tal como se explorará posteriormente, esta condição de “vida nua” não implica necessariamente uma situação de impotência política, mas antes obriga a uma experimentação de outras possibilidades. Tal poderia ser observável no caso das “5 esposas”, as quais, através da sua fuga e da recusa do papel que lhes é atribuído, colocam em causa as fundações em que sustenta o poder do Soberano. Ou, em particular (ainda que correndo alguns riscos de romantização), a figura quase anti-heróica de Max (também ele numa condição de vida nua, de homo sacer), o qual, face à sua situação na comunidade política em causa e às circunstâncias em que se encontra (no confronto entre a sua vida e a soberania), não deixa de apresentar um potencial messiânico para a construção de outros mundos e formas de vida.
Por último, naquele que é um dos últimos momentos do filme, em que o corpo de Immortan Joe é revelado ao “povo”, deparamo-nos não apenas com uma situação em que um possível novo Soberano mostra o corpo do anterior, mas acima de tudo a demonstração de que, ao contrário do que se fazia crer de forma a que Immortan Joe mantivesse o seu poder, este não seria um ser imortal e, logo, não seria Deus. Com tal gesto, é o próprio mito da transcendência e de uma figura – secularizada ou não - do Soberano que se ataca, tornando possível uma situação onde já não exista nem soberano nem governo. Tanto o medo imediatamente sentido por um dos filhos de Immortan Joe, observando esta cena no “alto”, como o “ataque” rapidamente feito ao cadáver do Soberano pela população, demonstra isso mesmo. Trata-se não tanto de um ódio ao anterior soberano e ao regime e situação que representava, mas sim a possibilidade de algo “novo” – mesmo que contingente e aberto ao conflito, sem uma necessária garantia, pelo menos à partida, de uma alteração estrutural das relações de poder em causa.

B) Logística
Outro dos temas observáveis no filme concerne o debate em torno da logística. Até como já salientado, uma das formas através das quais o Soberano mantem a sua posição passa pelo controlo que detém da organização logística da Cidade, isto através do acesso e gestão que faz da água, da infraestruturação que mantêm uma divisão entre o “alto” da Cidadela e a restante área onde se encontra a população, do controlo e uso de infraestruturas para a agricultura e outras formas de produção, ou a posse dos veículos que servem simultaneamente como meio de transporte (de pessoas e mercadorias, fundamental para trocas de produtos com outras cidades) e para fins militares.
O controlo e uso de tais infraestruturas configura um determinado mundo e torna possível determinadas formas de vida, sendo fundamental para a (re)produção do “estado de coisas”. A infraestrutura é um meio através do qual se cria uma determinada relação com o mundo e determinadas existências e formas de vida, isto através da criação e estruturação do quotidiano, do ambiente construído, dos movimentos e fluxos, das relações sociais.
Como sucede na cena central do filme, a transformação das relações de poder e a possibilidade de atingir um outro mundo implica que a configuração técnica e material deste não esteja sujeita ao governo de Um, mas sim a um uso comum – sendo que o confronto fundamental no filme incide precisamente sobre este ponto. Sendo que, para tal, não deixou de ser necessário um conhecimento do funcionamento da “máquina”, algo detido por Furiosa e Nux (do funcionamento da Máquina de Guerra - bloqueada e explorada para outros usos – à organização da cidade), bem como por Max e pelas “5 esposas” (sabendo da existência de água e do que tal permite na economia e relações de poder na cidade).
Para que tal tenha sido possível, foi ainda necessário não partir de uma concepção que se assumia enquanto “exterior” em relação à técnica e aos dispositivos que configuram o mundo em causa, mas antes mapear e procurar os pontos de fuga possíveis para estabelecer outras formas de vida – algo que passou, desde logo, pelo bloqueio e interrupção dos fluxos que estruturavam o mundo em causa, dependente da circulação de produtos entre cidades, isto através do uso da “máquina de guerra” para a fuga e combate a tal situação, emergindo com tal gesto outras possibilidades.

C) Corpo e Valor
Mesmo que faça referência a situações e relações constituintes do capitalismo, provavelmente não se poderá afirmar que o filme procura explorar e realizar uma crítica do funcionamento do mesmo. No máximo poder-se-ia afirmar, e mesmo assim de forma algo especulativa, que a situação em que se encontram não deixa de ser resultado de tal sistema. Contudo, não deixam de existir elementos que remetem para um imaginário e modo de funcionamento capitalista.
Em particular, e num sentido que tem vindo a ser explorado por diferentes perspetivas no que à questão do Valor diz respeito, é de destacar a centralidade conferida ao corpo e à esfera da vida neste filme. Esta questão é particularmente visível, e também genderizada, no caso de quem ocupa as funções de “5 esposas” e “mães de leite” em tal sociedade. Isto tanto no sentido de uma (re)produção de “força de trabalho” - como salientam algumas perspetivas feministas também focadas numa análise e crítica do capitalismo -, bem como enquanto “produtos/mercadorias” numa concepção de “economia” e das suas práticas e relações num sentido mais lato.
Também é dado destaque, mesmo que de forma figurada e no que seria uma referência a um aumento de uma “capacidade de agir” (e não de produção de mais-valia), ao caso dos WarBoys. Desde logo, a sua referência enquanto “meias-vida” (incapazes de se valorizarem e reproduzirem por si só, e apenas “produtores” de destruição) e a sua dependência dos “bolsas de sangue” (exemplificado pela personagem de Max, cujo seu “valor” é determinado pela sua biologia, a qual aumenta no caso de se tratar de um dador universal) permite uma possível leitura da relação entre trabalho morto e trabalho vivo - relação essa que conduziria a uma capacidade de (re)produção de uma mais-valia ao nível da luta e da reprodução de relações de poder (assumindo-se que um determinado modelo económico pressupõe um determinado estado de coisas).
Sendo que esta relação, entre trabalho vivo e trabalho morto como aqui exemplificados, também se insere num dispositivo específico - o qual, de uma forma semelhante ao que sucede no capitalismo em relação ao crédito ou à dívida, não deixa de implicar uma "promessa" que atua no sentido de intensificar um determinado trabalho sobre si mesmo, que neste caso passa pela possibilidade de atingir uma redenção e chegar Valalha, no caso de se realizar corretamente um determinado trabalho.
Ou seja, trata-se de uma representação que remete para a produção de valor através das diferentes esferas e potência da vida, para além do seu papel na reprodução de uma determinada situação de relações de poder. Neste sentido, deparamo-nos com uma situação em que as pessoas não deixam de ser vistas enquanto "coisas" (ou mercadorias) e as suas relações mediadas por mecanismos que (re)produzem uma determinada ordem.

D) Papéis de Género e Masculinidades Hegemónicas
Aquando do seu lançamento, o filme Mad Max – Fury Road foi alvo de disputa no que concerne à sua relação com o feminismo – destacando-se uma polémica com um grupo denominado de MRAs (Men's Rights Activists), os quais acusaram o filme de “ideologia feminista” e apelaram a um boicote ao filme. Num sentido político bem mais interessante, também não faltaram leituras feministas do filme, ainda que geralmente focadas no número e protagonismo conferido a mulheres enquanto protagonistas no filme, algo que, por si só, serviu para justificar a classificação de filme feminista por parte de tais análises. Não sendo de descurar tal ponto – até para efeitos de visibilidade e representatividade -, neste texto pretende-se explorar outros temas presentes no filme na sua relação com o feminismo.
Um desses temas diz respeito à crítica da visão e prática que tende a tomar as mulheres enquanto objetos (com papéis sociais definidos e estruturados segundo uma lógica patriarcal, exemplificados no filme através das figuras das “5 esposas” e das “mães de leite”) – sendo que, ao mesmo tempo, existe uma tentativa de apresentar, através do desenvolvimento do filme e da sua trama, exemplos que salientem a agência das mulheres, não as reduzindo a um papel meramente passivo.
Tal é particularmente exemplificado pela situação que despoleta a narrativa do filme, com a fuga das “5 esposas”. Esta fuga tem como razão principal a sua recusa em serem tratadas como “coisas” (como referiram as próprias, e deixaram escrito Cidadela). Esta fuga pode ainda ser tomada como um processo, ao longo do qual diversos momentos e fases levam a uma “tomada de consciência” da sua situação, bem como por uma passagem de uma defesa abstrata e quase “idealista” da paz para uma consideração e defesa da necessidade do conflito para a construção de outro mundo e formas de vida. Neste sentido, a sua fuga não segue o guião de uma travessia que, mais ou menos épica, seria conduzida única e exclusivamente por Furiosa (enquanto pretensa vanguarda e líder feminista) e por quem mais detivesse uma suposta maior capacidade inicial para a luta em questão – ao invés, a sucessão de experiências que as envolvem directamente no sentido de garantirem a sua existência e a possibilidade de outras formas de vida, é determinante para tal processo. O contato com as Vuvalini, um momento marcado por uma ambiguidade de emoções devido à mistura entra a alegria do reencontro e afinidade ético-político e a tristeza pelas notícias relativas à história e situação atual destas, poderá ser visto como uma experiência decisiva em tal processo de transformação – em particular, na consideração da materialidade e imanência da luta que enfrentam. Isto pela forma como constituem um exemplo de resistência diária (sem glorificação acrítica da mesma), demonstrada pela sua sobrevivência, sozinhas, num ambiente pós-apocalíptico como aquele em que se encontravam. Uma sobrevivência que, para além de um apoio mútuo e necessidade de criação de comunidade (algo que, contudo, poderá como que assumir uma equivalência “natural” entre cuidado e o que seria uma condição feminina), não deixou de parte o uso da violência caso tal se revelasse necessário (não caindo, assim, numa visão ingénua que advogaria o pacifismo e o aliaria a uma posição moralmente superior, em contraste com aquela tomada pelos seus inimigos). Durante este processo, é, assim, de salientar a mudança de uma concepção em relação à guerra por parte das “5 esposas”, passando de uma posição idealista e pacifista plasmada numa das frases que deixaram aquando da sua fuga – “Os nossos filhos não serão senhores da guerra” -, para uma outra onde compreendem a não existência de uma exterioridade em relação ao conflito e ao que tal implica.
Ainda sobre a crítica à forma como as mulheres são tratadas enquanto objetos e detêm papéis de género tão definidos, o conjunto de atividades desempenhadas por mulheres no filme e os papéis que lhes são atribuídos (visíveis nas designações de “5 esposas” e “mães de leite”) não só sinalizam a forma como determinadas funções associadas à reprodução são atribuídas ao género feminino, mas também demonstram a sua importância para a reprodução das relações de poder, isto tanto a um nível simbólico (devido aos papéis de género invocados e os significados dos mesmos) como a um nível económico (dada a importância dessas atividades para a reprodução da “força de trabalho” e para a manutenção de uma determinada “normalidade social e económica” com vista à produção de mercadorias e valor). Ainda sobre este ponto, o qual se relaciona com a relação entre corpo e valor anteriormente abordada, torna-se visível a forma como a mulher é tomado como um mero objeto e enquanto propriedade privada de alguém – desde logo, do soberano.
Além disso, a personagem de Furiosa, protagonista do filme – a qual não está imune a uma certa idealização na sua construção -, representa uma desconstrução do papeis e ideais tradicionais de feminilidade, apresentando uma outra estética e ética como possível (entre várias possíveis). Isto desde a dimensão agencial e as capacidades de que faz uso (tradicionalmente associadas a um papel masculino), como pela própria referência a uma possível condição cyborg (Haraway) ou “pós-humana”.
Outro tema central filme passa pela críticas das concepções tradicionais e hegemónicas de masculinidade. Em particular, várias vezes surge uma ligação entre masculinidade (na sua dimensão hegemónica) e a responsabilidade pela "destruição do mundo" – algo que surge de forma explícita duas vezes, uma primeira enquanto pergunta retórica, deixada na sala onde estavam as “5 esposas” e direcionada a Immortan Joe, e posteriormente voltada a um WarBoy.
A tensão entre as “visões” e as memórias que perseguem Max, e, por outro lado, o exemplo de relações que se observa entre Furiosa e as “5 esposas” e entre estas e as Valvuni, remete para uma tensão entre duas formas de relação social diferentes e genderizadas. Isto porque, enquanto a personagem de Max se encontra presa a uma visão de cuidado (ou responsabilidade) que se baseia numa figura tutelar e patriarcal como garante da sobrevivência da sua “família” (reproduzindo assim lógicas patriarcais, em que alguém – o homem - deteria essa responsabilidade, com ideais tanto de culpa como de carácter redentor associados a tal função); a outra visão de cuidado, inspirada numa ética feminista que procurará servir como base para a construção de comunidade na Cidadela, não parte de uma dependência em relação a uma só figura/pessoa e a papéis de género socialmente definidos e diferenciados, mas antes a uma acção coletiva que procura ir para além de tais divisões e hierarquias.
Ainda neste seguimento, é de notar uma situação de “separação” e isolamento que marca a personagem de Max, potencialmente expansível para outras figuras. Na reflexão inicial de Max, a qual inicia o filme, este refere uma deterioração individual associada à deterioração das condições de vida na terra, assumindo que tal o faz colocar em causa a sua própria saúde mental – em particular, devido às suas memórias, as quais o “perseguem”, dizendo-se “assombrado por aqueles que não conseguiu proteger”, perseguido pelos “mortos e pelos vivos”, vivendo uma existência reduzida a um “instinto de sobrevivência” num meio hostil. Esta é uma situação que acompanha Max ao longo do filme, marcada por uma tensão entre o seu “isolamento” e a tentativa de atingir uma situação de “redenção” e pertença a  uma comunidade, um objetivo que não deixa de emergir e até se tornar mais palpável a partir das relações que vai criando ao longo do filme, em particular com a cumplicidade e afetividade que acaba por construir com Furiosa. Em parte, é também isso que Max procura quando, na cena central do filme, ao invés de seguir isolado o seu caminho, volta atrás e apresenta o plano de conquistar a Cidadela, algo que seria feito de forma coletiva e permitiria a possibilidade de uma redenção e outras relações e formas de vida – isto mesmo que o objetivo de ir além do seu isolamento e nomadismo possa ser re-questionado no final do filme.
Também o percurso de Nux, o WarBoy que acaba por acompanhar e ajudar o grupo na sua fuga, é interessante neste processo de desconstrução da sua masculinidade e apresenta algumas semelhanças com o de Max. Sendo que, neste caso, é de destacar o momento em que este se confronta com o seu “falhanço” aos olhos de Immortan Joe, tendo sido incapaz de cumprir a sua missão, algo que o faz sentir culpado e julgar que, ao contrário do que pensava e lhe havia sido prometido, afinal já não seria um dos escolhidos a entrar no paraíso (Valhalla). Esta concepção é alterada quando, nesse momento, é apoiado por uma das “5 esposas” que o encontra numa situação de vulnerabilidade, conseguindo que este que os ideias de masculinidade e objetivos transcendência que sempre conheceu, em favor de uma concepção que privilegie os momentos e relações que se podem criar no aqui e agora, a partir de uma outra ética, de influência feminista.
No fundo, salienta-se que qualquer tentativa de construção de comunidade teria de ser diferente das formas de organização que atualmente se conhecem e enfrentam, uma comunidade que possibilitasse outras formas de relação e a desconstrução das formas de masculinidade hegemónicas vigentes no contexto em que se encontram. Ou seja, trata-se do reconhecimento da necessidade de uma alteração de relações sociais e de subjetividades, tanto como garantia de sobrevivência num contexto apocalíptico, como para a possibilidade de redenção e transformação das relações de poder.

E) Tempo que Resta e Potência Destituinte
E.1 Catástrofe e Apocalipse
Como se tornou claro ao longo do texto, o filme Mad Max retrata uma situação pós-apocalíptica. Trata-se de um tema que tem sido alvo de várias discussões, em particular a partir de algumas reflexões e discursos recentes em torno do antropoceno. Os discursos e as perspetivas são as mais variadas, mas, para efeitos deste texto, salientamos a ideia da “catástrofe” como algo que já aconteceu e com a qual temos de lidar a vários níveis (de ambientais a metafísicas), assumindo-se, assim, a premissa de que a catástrofe e o conflito/guerra “já cá está”, ao mesmo tempo que tal não implica a procura de uma qualquer escatologia, mas sim de um antagonismo e conflito imanente e contingente.
Neste sentido, para além de uma referência a tal situação, aquilo que se torna particularmente interessante em filmes como Mad Max é a demonstração de que, apesar da materialidade de tal contexto, as possibilidades políticas não se esgotam por completo e mantem-se presente uma ideia de contingência, da possibilidade do “novo”. Algo que, neste caso, não estaria dependente de um conjunto de condições materiais e objetivas tidas como ideias, mas antes para a possibilidade de um questionamento das relações e gestos que estruturam o quotidiano, das subjetividades e do possível num sentido mais alargado.
Ou, e agora fazendo referência a hipóteses que se poderiam qualificar como respeitantes a um certo “optimismo catastrofista” ou “optimista apocalíptico”, seria de salientar a ideia de que seria precisamente em eventos com tal especificidade que emergiria a possibilidade de uma suspensão e requestionamento do estado de coisas, dos mundos e formas de vida que o enformam. Uma ideia que, apesar de não ser aqui negada na sua totalidade, procurará ser aprofundada através de referências ao filme com o apoio de outras propostas, as quais vão não tanto num sentido escatológico que marca tais concepções, mas antes numa figuração messiânica que aponta para outra direção, como sucede com a ideia de “tempo do fim” ou “tempo que resta” apresentada por Giorgio Agamben.

E.2 Chronos e Eschaton. Tempo que Resta
Esta questão é, acima de tudo, uma questão temporal, de concepção relativamente ao tempo e ao que este significa e possibilita. A este nível, e mesmo sendo notória uma narrativa linear e cronológica no filme, este é marcada por diversos momentos com uma capacidade de intensificação e quase ruptura temporal – em particular, o momento em que o grupo em fuga decide voltar à Cidadela e entrar em confronto pelo seu controlo, numa mudança de estratégia política com implicações na relação com o real e sua temporalidade
É a partir desta leitura que se torna possível uma interpretação agambeniana relativamente à evolução do filme e das implicações ético-políticas do mesmo. Trata-se de uma interpretação baseada na problematização de Agamben (2005)[i] relativamente ao “tempo que resta” ou ao “tempo do fim”. Na sua reflexão, o autor pretende ir além de uma oposição entre chronos e eschaton, ou seja, entre uma concepção cronológica do tempo (representando a “duração do mundo da sua criação ao seu fim”) e uma escatologia apocalíptica (representando “um mundo por vir”).
Esta tentativa prende-se com a própria diferença entre messianismo (representado pelo apóstolo) e apocalipse (representado pelo visionário), dado que, enquanto o primeiro diz respeito ao “tempo do fim”, o segundo remete para o “fim do tempo”. A particularidade desta concepção messiânica da história passa pela referência a um momento em que o “tempo se contraí sobre si próprio e começa a acabar”, mesmo que se mantenha localizado entre o “tempo e o seu fim” – como refere Agamben, trata-se de um “tempo que resta”, um tempo entre chronos e eschaton, permitindo uma cesura que problematiza e impossibilita a própria oposição entre os dois. As possibilidades políticas de tal concepção temporal poderão tornar-se mais claras através da referência a uma das ideias com que Walter Benjamin finaliza as suas “Teses sobre o conceito de história”: “Como se sabe, os Judeus estavam proibidos de investigar o futuro. Pelo contrário, a Tora e as orações ensinam a prática dessa presentificação anamnésica. Isto retirava ao futuro o seu carácter mágico, que era aquilo que procuravam os que recorriam aos áugures. Mas isso não significa que, para os Judeus, o tempo fosse homogéneo e vazio, pois nele cada segundo era a porta por onde podia entrar o Messias." (Benjamin, 2010: 20; itálicos nossos)[ii]. Indo além da sua ligação teológica e da própria figura una do Messias, poder-se-ia ver em tal ideia uma ligação entre tempo e política que advoga uma ideia de contingência e possibilidade que privilegie o “aqui e agora”, uma concepção de tempo enquanto pura potencialidade.

E.3 “Chronos e Eschaton” – referências e semelhanças em Mad Max
Esta situação, de um “tempo que resta”, começa a torna-se visível quando, após terem conseguido escapar do primeiro momento de perseguição e de terem atingido aquele que seria o local inicialmente pretendido – local esse denominado de “Vale Verde das Muitas Mães”, um nome que não deixa de remeter para uma ideia de éden e de começo - , apercebem-se que o lugar que procuravam (já) não existe e que dele apenas resistiram um grupo de mulheres (as Valvuni), algumas das quais conhecidas de Furiosa (a qual nasceu e foi retirada enquanto criança de tal lugar). Sendo que, ainda antes de tal confirmação, a “dúvida” sobre a existência desse local começa a surgir quando as dificuldades e conflitos com que se deparam na fuga se intensificam. Quando chegam junto das Valvuni e elas lhes contam o que aconteceu, compreendem que tinham acabado de atravessar o que restava desse anterior Vale, agora transformado num local inóspito que as Valvuni tiveram de abandonar devido à falta de água.
O confronto com a ideia de que o lugar para onde desejavam chegar já não existe, após uma fuga que se revelou mais difícil do que aquilo que esperavam, configura não só um momento de desilusão e desespero, como o momento em que o “tempo se contraí sobre si próprio e começa a acabar”. Esse lugar, devido às condições de vida que enfrentavam e às recordações de infância de Furiosa, funcionava como que um Éden do qual se teria caído. A sua inexistência remete para um corte com uma cronologia que representava a “duração do mundo da sua criação ao seu fim”. Tal lugar configuraria, assim, uma espécie de Éden do qual a humanidade (ou parte dela) teria caído antes de se deparar com a situação pós-apocalítica na qual se encontraria de momento. As razões desse queda não são afloradas no filme, para além de referências a uma culpa que os “homens” (enquanto um género que pelas suas acções e mundivisões teria destruído o mundo, ou um “mundo”).
Além disso, também se poderia salientar a importância e papel do imaginário, e em particular da memória coletiva em qualquer processo político. Sendo verdade que o “Vale Verde” já não existe, num sentido físico e mais restrito do termo, a sua permanência na memória de alguns sujeitos acompanhado de possíveis lendas e discursos sobre o mesmo, não deixou de ter efeitos materiais, como aliás se observa no filme - isto é, sem a “promessa” de um “Vale Verde”, talvez tanto mais “real” quanto mais “imaginado” (e imaginado na sua relação e oposição a uma outra situação existente), a fuga de Cidadela e o processo que aí se inicia provavelmente nunca teria acontecido. E se é verdade que essa fuga não viu cumprida a sua promessa, sem esta talvez não teria sido possível o despoletar de um processo em que essa mesma promessa se visse confrontada e requestionada em favor de um processo mais imanente e aberto à contingência, com todos os limites e potencialidades que possa acarretar.
Face à situação com que se depararam, do não-regresso a um lugar prometido, surgiu no grupo uma primeira hipótese que, em parte, é semelhante e encontra-se na continuação da lógica da hipótese anterior. Esta teria como base um plano que incluiria uma viagem que perspectivavam durar 160 dias, possibilitada por um conjunto de recursos e provisões que restariam, implicando o atravessamento de um deserto de sal e tendo como esperança o atingir de um outro lugar onde, acreditavam, existiria água, recursos e a possibilidade de construir um mundo novo.
Esta ideia é exposta numa cena em que Furiosa convida Max a juntar-se ao grupo na viagem, algo que este recusa. Desta decisão, duas leituras são possíveis: 1) uma onde ele simplesmente recusa fazer parte de tal comunidade e pretende “seguir o seu próprio caminho”, como refere a Furiosa; 2) ou uma recusa que se deve, acima de tudo, ao que seria a sua descrença em tal plano, rapidamente expressa quando diz que a “esperança é um erro”, uma afirmação que mais do que uma desistência e um qualquer pragmatismo remete mais para uma concepção de não exterioridade em relação ao conflito no aqui e agora, isto é, de uma imanência onde o presente não é tomado como um meio para um qualquer fim futuro, bem como para a ideia de “que a salvação só surge quando se deixa de acreditar nela”.
Assim, e enquanto o “Vale Verde das Muitas Mães” remetia para um passado, mais ou menos concreto, este outro possível lugar a atingir adquire um sentido escatológico. E se à primeira vista poderíamos ver uma quase oposição entre os dois, a verdade é que ambos fazem parte de uma mesma concepção de tempo, em relação à qual uma concepção como a do “tempo que resta” não deixa de se opôr e ir além da mesma.

E.4 Tempo que Resta e Imanência
É por se encontram entre o “tempo e o seu fim”, entre um chronos sem a sua arché e a impossibilidade de atingir uma qualquer solução escatológica, que emerge uma situação de “tempo que resta”.
Esta situação surge quando, novamente através das visões que acompanham Max, este se debate com a necessidade de ajudar os seus amigos e, também, de contribuir para a criação de uma outra comunidade. Voltando atrás na sua decisão de “seguir o seu caminho”, acaba por convencer os restantes de que o plano que têm e pretendem seguir não é mais do que uma ilusão, que poderão tentar uma travessia do deserto mas não irão encontrar nada no seu final, enquanto que, caso compreendam que não existe um fora em relação aos conflitos e relações de poder, poderá existir uma possibilidade – inclusive redentora - de construção de um outro mundo. Esta possibilidade passaria por um regresso à Cidadela e uma luta pelos recursos e condições materiais que nela se encontra (da existência de água às infraestruturas). Neste sentido, dá-se uma defesa da imanência, e de uma estratégia política voltada para o reconhecimento das necessidades que têm em comum e para a forma como essas podem ser satisfeitas, de forma articulada com a construção de outros mundos e formas de vida, já sem a delegação da sua existência a uma qualquer entidade transcendente (do Estado a Deus).
Assim, ao invés de acreditarem numa salvação que adviria da aplicação de um programa que prometeria um futuro sem conflitos, com o qual não só não haveria qualquer relação imediata e concreta com o presente nem uma abertura a uma ideia de contingência, reconheceu-se que, de forma a atingirem as suas intenções seria necessário um confronto político com o Soberano.

E.5 Potência destituinte
Após a aceitação e adopção de tal decisão, acabam por conseguir voltar à Cidadela, numa luta com dificuldades e que não deixou de envolver a morte de alguns dos membros do grupo, mas também a morte do Soberano e a vitória sobre o seu exército. É neste seguimento, e também tendo em conta o que sucede quando regressam, que se pode questionar a hipótese de uma destituição do poder como presente no filme. No fundo, trata-se de um debate sobre se a cena final corresponderia a uma defesa de uma potência destituinte, ou se, pelo contrário, não passaria de uma simples substituição de um Soberano por outro, mesmo que agora de cariz democrático e com sensibilidades ético-políticas diferentes.
Após o já referido momento em que o corpo de Immortan Joe é revelado, o grupo é içado para o “alto”, e com ele não vão apenas os elementos que o constituem, mas também sobem várias pessoas da cidade, cuja diversidade não deixa de representar, pelo menos, uma entrada ou uma representação política de outras subjetividades e grupos sociais, até então afastadas do poder. Sendo que para esta leitura também contribuí a abertura das comportas, como sinal de satisfação das necessidades e distribuição dos recursos, agora de acesso e uso por parte de todos.
Contudo, tal gesto e as alterações de poder que possam representar, não significam, por si só, uma possível situação de destituição de poder, mas muito provavelmente a constituição de um novo. Isto tanto porque tal “subida” é precedida de um momento de aclamação a Furiosa quando esta se revela, como se lhe fosse atribuída e delegada a Soberania.
Uma hipótese que problematize esta “subida” num outro sentido, mesmo que em si contrária ao que diria respeito a uma potência destituinte, diz respeito à possibilidade de tal “subida” ter como objetivo o “desativar/inoperar” da “máquina” – até porque, e novamente segundo a leitura de Agamben, tal gesto não implica necessariamente a sua destruição, mas antes um gesto que desative e inopere a sua “função de comando”, neutralizando-a. Mas esta hipótese é problemática desde logo por implicar a atribuição de tal tarefa a um dado sujeito – individual ou coletivo -, o qual não deixaria de se encontrar preso numa dialética entre o constituinte e o constituído - no sentido em que implica um primeiro passo de "ocupação do poder" mesmo que com o objetivo de o "inoperar" -, e, assim, encontra-se incapaz de sair do próprio paradigma que reproduz a Soberania. O próprio facto de tal ser realizado por personagens que, tal como retratadas no filme, parecem quase destinadas a enfrentar e suprir qualquer adversidade também não deixa de invocar uma certa ideia e figura de vanguarda.
No entanto, é através de tal problemática que se pode encontrar alguns dos principais limites e alvos de crítica em relação à ideia da potência destituinte, precisamente por trazer ao de cima o questionamento sobre as estratégias e limites de acção política atualmente possíveis[iii] – em particular, aqueles que se confrontam com o poder do Estado. Isto é, será que a ideia da potência destituinte não tem implícita uma concepção do poder que, em última instância, parte de uma posição em que se toma como pretensamente exterior ao mesmo - ou, pelo menos, como partindo da possibilidade de uma não relação com o poder no atual momento, com tudo o que tal implica.

E.6 Contingência e Formas de Vida
Para além desta dúvida em torno da soberania, o filme acaba com várias questões em aberto. Para além do questionamento sobre as formas de organização futuras na Cidadela, é ainda de salientar o próprio futuro das personagens, em particular o de Furiosa e Max. A cena final acaba precisamente com uma troca de olhares entre os dois – na qual se denota uma componente afetiva e um reconhecimento mútuo do trabalho realizado -, num momento em Furiosa, ao subir, se apercebe que Max ficou em “baixo” e parece ir embora, provavelmente para novamente “seguir o seu caminho”. Devendo-se tal decisão não só ao que poderia ser o reconhecimento de uma tarefa cumprida e esgotada em tal acção, mas, talvez, também ao desejo de não fazer parte de um possível novo governo. Ao invés, poder-se-ia supor a tentativa de construção de uma outra forma de vida[iv] - algo que se liga de forma central à ideia de potência destituinte[v] -, ainda que tal tentativa pareça passar unicamente por uma forma individual e, como tal, apresente várias limitações, desde logo devido à dimensão relacional das formas de vida. O momento que se segue, e que corresponde ao momento final do filme, apresenta uma citação que parece confirmar esta hipótese relativa ao futuro de Max: “Where must we go… / we who wander this wasteland / in search of our better selves?”.
No entanto, o facto de o filme acabar de tal forma, sem uma enunciação clara do que “viria depois”, remete para a própria dificuldade de figuração de um "mundo por vir" e das outras formas de vida que lhe responderiam, até pela sua dificuldade e quase impossibilidade de representação, isto é, pela impossibilidade de definir, à partida e em tal contexto, como seria tal mundo. Reconhece-se, assim, que essa definição seria sempre influenciada por imaginários e práticas de um contexto anterior, bem como que tal construção remete para um processo que implica uma relação sempre contingente e aberta ao conflito.


[i] Agamben, G. (2005). The time that remains: A commentary on the letter to the Romans. Stanford University Press.
[ii] Benjamin, W. (2010). O Anjo da História. Assírio & Alvim.
[iii] Numa entrevista recente, Agamben apresenta uma leitura que desafia a argumentação apresentada até aqui, em particular no que seria a primazia da “luta” sobre a “fuga” (mesmo que tais conceitos apresentem significados diferentes). Contudo, não é de supor que Agamben esteja pura e simplesmente a dizer para “fugirmos”, mas antes a defender que as práticas políticas que escolhemos e aplicamos não só se mantenham dentro e reproduzem uma determinada metafísica política e teologia de teor ocidental. Sendo que indica, como única possibilidade no atual contexto, uma procura de outras formas de subjetivação política para além daqueles que atualmente são as enquadradas e capturadas pelas lógicas do “Poder”. Neste sentido, uma das razões pela qual a ação representada neste filme não deixa de apresentar este carácter ambíguo com a soberania deve-se precisamente pela adopção de uma concepção de acção política marcada e estruturado pelas lógicas do “Poder” e da Soberania. Como refere Agamben:
“Penso que o modelo da política que conhecemos, fundado sobre a ação e sobre a luta, no contexto do domínio da economia e do estado de segurança em que vivemos, tenha se tornado obsoleto. O paradigma da luta, que monopolizou a imaginação política da modernidade, deve ser substituído por aquele da linha de fuga. Penso que na Grécia o Syriza teve de capitular justamente porque havia se empenhado numa luta sem saída, renunciando à única via possível: a saída da Europa. E isso não é verdade apenas na política, mas também para a existência individual: o essencial, em todo caso, e Kafka não se cansa de lembrar, não é lutar, mas encontrar uma linha de fuga. Como diz Pulcinella: ubi fracassorium, ibi fuggitorium, onde há uma catástrofe, aí há uma linha de fuga.” http://flanagens.blogspot.pt/2016/09/do-desastre-nos-salvara-vileza-de.html
[iv] Sendo que, pelo termo “forma-de-vida”, Agamben pretende significar, acima de tudo, uma vida em que cada forma, ato, gesto e processos de vido não são meros factos, mas sempre e acima de tudo possibilidades de vida, sempre e acima de tudo potencialidade[iv] – “By the term form-of-life, we mean a life that can never be separated from its form, a life in which it is never possible to isolate something like a bare life. A life that cannot be separated from its form is a life for which, in its way of living, what is at stake is living itself, and, in its living, what is at stake above all else is its mode of living. What is at stake, then, is a life in which the single ways, acts, and processes of living are never simply facts, but always and above all possibilities of life, always and above all potentiality [potenza].” (Agamben, 2014: 73). Agamben, G. (2014). What is a destituent power? Environment and Planning D: Society and Space32(1), 65-74.
[v] “The destitution of power and of its works is an arduous task, because it is first of all and only in a form-of-life that it can be carried out. Only a form-of-life is constitutively destituent.” (Agamben, 2014: 72). Agamben, G. (2014). What is a destituent power? Environment and Planning D: Society and Space32(1), 65-74.